quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Como uma viagem

Sentada no sofá, mentalmente num lugar entre pensar em nada e divagar, recebi meus 30 anos. Não aqueles 30 que completei no dia 30, mas os trinta anos internos. Tive o pensamento óbvio de que daqui há 10 terei quarenta, serei quarentona. E então, se tiver sorte, terei chegado à metade da minha vida (que aliás só quero que continue enquanto tiver um mínimo de controle sobre mim). Metade.

Metade. O primeiro impulso foi dizer em voz alta "caralho, então vamos viver intensamente esses dez anos, como se fosse uma conta pra pagar!". Prá vocês verem como são as coisas! Para mim uma urgência são contas a pagar. Devem ser pagas, não devem e não podem ser proteladas. Não as deixamos pra trás, nunca, sob várias penalidades.

Mas nossa vida sim! Adiamos, esquecemos ou fingimos que algumas coisas não existem. Simplesmente porque o castigo não vem a cavalo. Ele vem a lesma. Ele vem no fim, quando já não há o que fazer, ou quando não há mais tempo para se fazer o que devia ter sido feito. Às vezes, montado na lesma ele chega no meio, em forma de reflexão. Cabe ao leitor encarar ou correr do castigo quando ele chega em tempo hábil. Mas se escolher correr não importa o quanto corra... lá na frente... já sabem.

E aos que encaram cabe tomarem para si o poder de transformar.

Essa minha lesminha trouxe o baque sobre o baque: primeiro a reta até os quarenta, na vibração de uma corrida 100m com barreiras. Depois, ver o que considero sério em detrimento do que realmente importa e deixo passar. (Nem ficarei divagando aqui sobre trabalhar pra viver versus viver para trabalhar mas essa tendência me assusta e fujo dela com força. )

E vocês também, a maioria, arrisco. Fazem tudo super certinho. Tudo que não importa realmente pra alma.

Tá legal, não sou hippie, nem acho que podemos viver de amor ou luz solar apenas. Temos necessidades básicas e fúteis também. Não há problema com a futilidade sem exageros: elas trazem prazer e desvincular-se delas seria algo impensável uma vez que absorvemos essas coisas como oxigênio.

Para afastar-se de tudo que não seja puramente puro (pisc) teríamos que nos transformar em seres impossibilitados de participar socialmente. E mesmo que escolhêssemos isso, mudar-se, transformar-se, é uma escolha de difícil manutenção. É diária, é a todo segundo. É estar alerta o tempo todo até a transformação consolidar-se. E ainda depois.

Não tenho essa intenção de super elevar-me espiritualmente num nível fodido (percebe-se né?). Hoje não estou aqui pensando no que poderia fazer pelos outros, aqui estou pensando no que posso fazer por mim.

Não acho que devamos ser inconsequentes na busca por prazeres da vida, e até entendo essa atitude, mas acho que devemos sim nos dedicar a buscar o que nos faz bem. Com afinco. Com o mesmo afinco que você levanta da cama de manhã e cumpre tuas obrigações.

Na continuação do pensamento do sofá fui avançando as décadas até, pum, vai chegar, o dia vai chegar e eu vou morrer. Mas isso não importa, o que importa é ter aproveitado a porra toda. A volta que dei foi essa: aproveitar sem ter dúvidas de ter aproveitado, pra chegar no dia e poder morrer sem a companhia da culpa sobre a lesma.

E nessa direção, cheguei à sensação que tenho sempre que faço uma viagem. Foi exatamente essa sensação que senti sobre a vida. Tentarei explicá-la apesar de não ser uma ideia concreta no momento em que se passa: quando chega no terceiro ou quarto dia de uma viagem de 7 dias, começo a sentir uma sensação estranha que me faz avaliar se aproveitei bem os primeiros dias.

No meio desse balanço coloco o fato de que ainda falta a metade, metade, e posso continuar aproveitando, sem paranóias sobre a quantificação do aproveitamento. Mas o sentimento já se instalou e ele libera outra coisa: a sensação de não querer que acabe mesclada com a sensação de que sei que vai acabar rápido, porque  os três primeiros dias passaram voando e foi como se eu mal os tivesse visto.

Essa sensação. De algo que está se esvaindo, que quero segurar mas é impossível. Se instalou.

Mas dessa vez a viagem é mais longa e realmente não quero que passe rápido, nem quero ficar com a sensação 'mas já?!?'.

Vivamos mais! Sempre e todo dia!

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